15 de dezembro de 2007

O peregrino e a gaivota




Enquanto se aproximava, indagava-se: por que estaria aquela gaivota pousada ali, sozinha, como se estivesse chocando os ovos, no relevo de uma duna, de frente para a praia, e não voando como as demais? Aproximou-se vagarosamente, ainda na esperança que a ave levantasse vôo. Quem sabe só estivesse descansando? O dia era chuvoso e frio. E, por acaso, ele passava por ali, numa de suas peregrinações habituais. Curioso era a gaivota não reagir à sua aproximação; não demonstrar nenhum medo. Se muito a ave fez, foi erguer a cabeça pro seu lado, como também o saudasse. Talvez ele tenha dito: olá! O que se passa, dona gaivota? Você está doente? Estava tão perto dela que podia tocá-la. Mas como a gaivota não respondeu, apenas sentiu, ocorreu-se entre os dois um imenso silêncio, que só não foi maior que o murmúrio das ondas do mar, para onde a gaivota antes olhava. O mar que fora inteiramente dela, um dia... Talvez a ave estivesse escolhido aquele início de primavera, aquele momento, aquele lugar, para morrer... Talvez estivesse ferida... Vá saber... Antes que tomasse a iniciativa de levá-la consigo, pra cuidá-la, ele pensava: estaria afastando-a do seu habitat natural e talvez ela morresse num mundo estúpido e insensível, como o seu... Seria inteiramente injusto! Que direito tinha, se ele, peregrino, estava ali, exatamente, procurando encontrar-se, longe das mesmices de um mundo cruel e desumano... Mesmo que fosse triste a cena, ele levantou-se e seguiu o seu caminho, na certeza de que havia feito o melhor, deixando apenas as marcas na areia, como prova, de que por instante estivera ali, com ela, a sua misteriosa gaivota.

Nenhum comentário: